14 julho 2010

Amizade

O que é a amizade?

Será a amizade estar simplesmente lá para quando os amigos precisam?

Será a amizade confrontar os amigos, mesmo quando não querem?

Será apenas dar um ombro amigo e fazer de conta que compreendemos?

Sinceramente, não sei.

Sei é que não consigo ser amigo de ninguém sem ser sincero, frontal. O que é muito duro e muito complicado. Especialmente que nem sempre consigo dizer as coisas com a moderação que deveria, o que é lamentável.

Ainda hoje fui mais uma vez surpreendido por uma amiga minha e da Célia, que eu nem reconheci de tão diferente que estava.

Ela percebeu que não a tínhamos sequer reconhecido e veio então ela falar connosco, já não a víamos há mais de um ano, gostei bastante de a ver, muito mais alegre e bem disposta, e claro a vender saúde. :)

Eu sinceramente não sei que tipo de conversas terei tido com ela, mas sei que fui sincero com ela, tal como fui com todos naquele sítio. O que para muitos é uma grande crueldade.

O mais provável é ter sido mesmo cruel ou desagradável com ela, não sei, passei por alguns momentos muito complicados pelo meio, inclusive perdi uma amiga com cancro nessa altura. E nesse caso terei pecado por defeito, por ser uma amiga de longa data e nunca me ter passado pela cabeça que ela não estivesse a ser sincera. Quando percebi a forma como ela estava a encarar as coisas era tarde demais e isso puxou ainda mais por mim neste aspecto desagradável.

Lamento dizer, mas não dei o ombro para ninguém chorar, ouvia o que todos tinham para dizer, compreendia-os, mas sempre os motivei a encontrar alternativas, a lutarem por aquilo que os fazia felizes.

Nunca fui de pintar cenários cor de rosa, sempre fui de enfrentar a realidade dos factos e identificar os factores de risco associados.

Sempre fui de defender que os adamastores podem ser vencidos, desde que estejamos dispostos a isso.

A verdade é que esta não foi a primeira vez que fomos surpreendidos por antigos companheiros que já não víamos há imenso tempo, com os quais tinha tido este relacionamento controverso, na verdade foi pelo menos a 4ª vez.

Não sei qual o verdadeiro motivo pelo qual fazem questão de falar connosco quando seria mais fácil ainda simplesmente fazer de conta que não nos tinham visto ou reconhecido.

Terá sido porque num momento complicado das suas vidas sentiram que alguém não se esteve a borrifar para eles? Será por uma questão de pena? Não sei, o que sei é que tipicamente as pessoas me gostam de rotular de intrometido, de arrogante, de que tenho a mania, etc.

O que é engraçado é de que de uma forma ou de outra com estas pessoas até teríamos tido muito para falar caso tivesse existido essa oportunidade.

Um chegou a pedir-me para ir lá falar com ele à sala já que ia lá ficar umas boas horas, mas era uma área reservada e as salas não estão feitas para as pessoas estarem acompanhadas. E claro a minha reputação ainda deve ser conhecida pelos enfermeiros.

É que contrariamente às pessoas que fazem voluntariado nos hospitais, eu não dou palavras de conforto, é de desconforto mesmo, faço as pessoas sentir que podem efectivamente controlar e ultrapassar os problemas que têm.

É que quando acreditamos que não conseguimos, não conseguimos.

Por isso, tentando responder à pergunta, a função do amigo não é certificar-se de que os amigos não precisam de um ombro para chorar?

É certo que não tenho muitos amigos, é certo que sou bruto com eles, mas na maioria dos casos não me tenho de preocupar com eles, porque de uma forma ou de outra eles estão bem com a sua vida.

Sabem o que querem e muitas vezes até sabem bem o que penso das asneiras que andam a fazer, mas quando precisam ou eu preciso, é na hora.

O que é mais estranho, é socialmente ou melhor oficialmente nem sermos amigos, por este ou por aquele motivo, e estarmos por vezes muitos anos sem nos falarmos.

Mas quando nos encontramos é como se tivéssemos sido sempre grandes amigos.

Será este o desígnio da nossa sociedade, que obriga a amizade sincera a ser clandestina? Não sei, sei que por vezes a sociedade tem tendência a colocar uma carga sobre a amizade que não é real, tendo no meu caso chegado a por em causa a minha orientação sexual.

Actualmente o maior problema é sempre com as amigas, algumas casadas, outras com namorados, é sempre um bocado complicado. Uma vez estava a falar com uma na presença do marido e o homem não conseguia disfarçar o quanto incomodado estava, embora fosse uma conversa perfeitamente normal.

E eu até sou daquelas pessoas que evita ao máximo fazer elogios ao cabelo, à roupa ou aos sapatos, tocar ou dar beijinhos porque tento ao máximo evitar mal entendidos e problemas, apesar de saber quão importante é esse tipo de feedback para as mulheres.

Por isso, o moral da história, acho que é este, se tens muitos amigos sempre a chorar no teu ombro, então tu és parte do problema, não és parte da solução.